Ação questiona leis que estabeleceram cargos na Câmara Municipal

Está tramitando junto ao Tribunal de Justiça (TJ) de São Paulo, uma Ação Direta de Inconstitucionalidade proposta pelo Procurador-Geral de Justiça Jurídica do Estado, Mário Luiz Sarrubbo, em face à Câmara Municipal de Vargem Grande do Sul, questionando a constitucionalidade das leis nº 2.647, de 7 de abril de 2006, que dispõe sobre o Plano de Carreira dos Servidores Públicos da Câmara Municipal; lei nº 2.820, de 24 de novembro de 2008, que alterou a lei nº 2.647 ao extinguir o cargo em Comissão de Diretor Geral e dá outras providências; lei nº 4.292, de 21 de dezembro de 2018, que dispõe sobre a criação do cargo de assessor especial da presidência e do inciso III do art. 25 da Lei Orgânica do Município e da alínea ‘d’ do inciso I, do art. 20 do Regimento Interno da Câmara.
Tudo teve início, segundo apurou a Gazeta, quando o atual auditor de Controle Interno da prefeitura municipal, José Geraldo Locatelli Júnior ofereceu uma denúncia ao Ministério Público em São Paulo contra a contratação do assessor especial da presidência da Câmara, o advogado Valter Luís de Mello pelo então presidente do Legislativo, vereador Paulo César da Costa, o conhecido Paulinho da Prefeitura, logo no início do seu mandato como presidente, em janeiro de 2020.
Locatelli Júnior, como gosta de ser tratado, 48 anos, é funcionário concursado e está no cargo há cinco anos, sendo o primeiro servidor a exercer este cargo na prefeitura de Vargem. Sua função é verificar a legalidade de todos os atos da gestão pública, tanto na administração direta, como também indireta, como os repasses que a prefeitura efetuar à Câmara ou a outras entidades. Ele é formado em administração de empresa e tem pós graduação em recursos humanos.
Na entrevista que concedeu ao jornal, Locatelli Júnior disse que a denúncia por ele feita tem por base o desrespeito a um Termo de Conduta firmado entre a Câmara Municipal e o Ministério Público, através do promotor Leonardo Meizikas, que obrigou a Câmara a exonerar do cargo o então assessor jurídico do Legislativo local em 2017, cujo cargo até então era comissionado, obrigando a realização de concurso público para o cargo de procurador jurídico da Câmara. O concurso foi realizado em 2018 e o cargo preenchido, sendo hoje exercido pela advogada Maria Eugênia Mesquita Fernandes.
Acontece que em 2018, o então presidente da Câmara, vereador Fernando Corretor, criou o cargo de assessor especial da presidência, através da lei nº 4.292, de livre nomeação e exoneração pelo presidente, que tinha como atribuições específicas assessorar diretamente e pessoalmente o presidente da Câmara em qualquer ação política e administrativa, quer seja nas reuniões, sessões ordinárias, podendo ser convocado a qualquer horário, auxiliar e instruir o presidente, planejar, coordenar, acompanhar e executar ações relativas a assuntos do gabinete.
Nem o presidente Fernando Corretor e depois em 2019, Felipe Gadiani que o sucedeu, contrataram o assessor especial. Quando assumiu a presidência da Câmara em 2020, segundo informou ao jornal Locatelli Júnior, o primeiro ato do presidente Paulo César da Costa no dia 2 de janeiro de 2020, foi nomear o advogado Valter Luís de Mello como agente especial com um salário de R$ 5.500,00 por mês.
“Foi aí que configurou a irregularidade contrariando a Constituição e o Termo de Ajuste de Conduta firmado entre a Câmara e o Ministério Público”, falou o auditor de controle interno da prefeitura Locatelli Júnior. Para ele, não se pode inserir nos quadros dos servidores da Câmara Municipal, advogado conhecido na cidade, sendo que a Câmara já possui um procurador jurídico.
“Se houver condenação, pode ser que a Justiça determine que o dinheiro pago ao assessor especial neste ano de 2020, algo em torno de R$ 80 mil, tenha de ser devolvido aos cofres municipais pelo vereador Paulinho da Prefeitura”, ponderou Locatelli Júnior.
A ação proposta pelo Ministério Público em agosto de 2020, não foi dada conhecimento aos membros do Legislativo na época pelo presidente Paulinho, segundo disse Locatelli Júnior. Segundo o jornal apurou, só em meados de outubro alguns vereadores tomaram ciência da situação.

Ação passou a atingir todos os cargos
O que começou como uma denúncia envolvendo o cargo de assessor especial da presidência da Câmara Municipal, na ação desenvolvida pelo Procurador-Geral de Justiça acabou envolvendo todos os cargos criados na Câmara Municipal a partir de 2006. É que, como acima descrito, o procurador argumentou na sua ação que as leis nº 2.647, nº 2.820 e nº 4.292 seriam inconstitucionais, pois não teriam sido encaminhadas para sanção ou veto do chefe do Executivo.
Também considerou espécie normativa inadequada para a instituição, transformação ou extinção de cargos de servidores da Câmara Municipal e processo legislativo de produção da norma que subtraiu etapa de participação do Poder Executivo.
Também o procurador arguiu a inconstitucionalidade do inciso III do artigo 25 da Lei Orgânica e a alínea ‘d’, do inciso I, do art. 20 do Regimento Interno, que estabelecem processos legislativos municipais em desconformidade com a previsão nas Constituições Estadual e Federal. Por fim, o procurador na sua ação, citou a contrariedade aos arts. 20, III, 21, 28,111, 115, XI e 128 c.c o art. 144, da CE/89.

“Fizemos tudo de acordo com a lei”
Procurado pela Gazeta, o ex-presidente da Câmara, vereador Paulo César da Costa, o Paulinho da Prefeitura (PSB), disse que fez tudo de acordo com a lei.
Já o ex-assessor especial da presidência, o advogado Valter Luís de Mello, na entrevista que concedeu ao jornal, afirmou que não houve irregularidade na contratação feita pelo presidente Paulinho. “Foi tudo com base em leis aprovadas pelos vereadores, que não foram vetadas pelo prefeito e que têm seus efeitos jurídicos prevalecendo até hoje. Tanto que o Tribunal de Contas do Estado não questionou nada absolutamente com relação a estas leis e seus desdobramentos”, afirmou.
Também argumentou Valter, que em nenhum momento do processo o Ministério Público mencionou sobre a ilegalidade do cargo de assessor especial da presidência, mas sim quanto à questão formal da criação das leis. “O cargo é direcionado à assessoria direta e pessoal do presidente da Câmara Municipal, não se trata de assessor jurídico”, falou. Quanto ao Termo de Ajusta de Conduta (TAC), que o Ministério Público exigiu em 2017, disse que é com relação à Câmara Municipal contratar através de concurso público, um procurador jurídico para todo Poder Legislativo, o que já foi feito, não tratando o TAC da contratação de assessor especial da presidência da Câmara.
Prosseguindo na sua entrevista, disse que a representação do auditor de controle interno da prefeitura ao questionar a constitucionalidade do cargo de assessor especial da presidência da Câmara junto à Procuradoria de Justiça, culminou com uma ação direta de inconstitucionalidade em face de várias leis que estruturam o quadro de carreira de todos os servidores do Legislativo de Vargem.
Atualmente estão ocupados os cargos de servente, auxiliar de secretaria e de contabilidade, contador, agente legislativo, administrador de departamento e procurador jurídico. O atual presidente da Câmara, vereador Celso Itaroti Cancelier Cerva não nomeou ainda uma pessoa para o cargo de assistente especial da presidência e ao ser indagado pelo jornal se iria contratá-lo ou a outro profissional, não respondeu às perguntas formuladas pela Gazeta.
Segundo o advogado Valter, a criação de todos estes cargos passou a ser questionada pelo Ministério Público, que deu a entender que os mesmos deveriam ser instituídos por resolução e não através de lei, como o foram quando da sua constituição através da Lei nº 2.647 que dispôs sobre o Plano de Carreira dos Servidores da Câmara Municipal.
“A formação de uma lei é um processo legislativo mais complexo, que exige aprovação pelos vereadores e depois a sanção ou veto do prefeito. Só então voltando à Câmara para sua publicação”, disse Valter. Explicou que foi assim que aconteceu com todos os cargos dos servidores da Câmara, que foram criados por lei e passaram pela sanção do prefeito, inclusive o de assessor especial da presidência da Câmara.
Por resolução, disse que o processo legislativo é mais simples e não necessita passar pelo prefeito. “A questão se resolve no âmbito interno da Câmara, com a aprovação e promulgação feitas pelo presidente do Legislativo. É isso que o Ministério Público busca obter através da ação direta de inconstitucionalidade. Isso tem a ver com a independência dos poderes, segundo o posicionamento do Ministério Público. Resolução é uma norma mais simples de ser editada, que retira do prefeito qualquer possibilidade de intervir no processo legislativo,” afirmou.

Direitos garantidos
Toda a celeuma levantada pela ação de inconstitucionalidade proposta pelo Procurador-Geral de Justiça, criou muita expectativa junto aos servidores municipais da Câmara, que passaram a temer pelas consequências que a ação pode ocasionar aos seus cargos e vencimentos. Porém, segundo explicou Valter, todos os direitos dos servidores estão garantidos. Explicou que todos os cargos foram instituídos por lei, houve os concursos e eles ocupam os mesmos há vários anos. “Caso a ação de inconstitucionalidade seja dada procedente pelo Tribunal de Justiça, todos os cargos terão de ser criados novamente através de resolução, mantidos os atuais direitos conquistados. Na própria resolução vai ter que constar isso, preservando estes direitos, até pela irredutibilidade salarial de acordo com a Constituição”, afirmou.
A ação está em andamento e até agora, nem a Câmara Municipal e nem o prefeito foram intimados a prestarem as informações junto ao TJ de São Paulo.

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