Sant’Ana e sua história pelos séculos

Obra “A Virgem e o Menino com Santa Ana”, óleo sobre madeira, de Leonardo da Vinci, pintada em Milão, entre 1508 e 1513

Viva Sant’Ana!

Especial traz a história de Ana, as demonstrações de fé e devoção em sua homenagem pelo mundo e a importância de Sant’Ana na origem de Vargem Grande do Sul

Sant’Ana e sua história pelos séculos

Obra “A Virgem e o Menino com Santa Ana”, óleo sobre madeira, de Leonardo da Vinci, pintada em Milão, entre 1508 e 1513

Márcia Aparecida Ribeiro Iared


Se Sant’Ana é a principal referência católica de nossa cidade e nossa Padroeira, eu estranhava que sempre que ia às lojas e fábricas de materiais religiosos, nunca encontrava à pronta entrega as medalhas de Sant’Ana, tinha sempre que encomendá-las, enquanto medalhinhas de Nossa Senhora das Graças, de Nossa Senhora Aparecida, Nossa Senhora Desatadora dos Nós sempre havia em profusão à venda para quem quisesse. Resolvi pesquisar mais fundo o que a gente já sabia sobre Sant’Ana, porque era estranho que a mãe de Maria e avó de Jesus não tivesse uma presença muito maior no Brasil e na América assim cmo tem em outros países.
Foi aí que encontrei respostas no sentido de que a História de Sant’Ana, mesmo sendo a mãe da Virgem Maria e avó de Jesus Cristo Salvador, não consta na Bíblia Sagrada. Ela está no que se chama de Proto Evangelho de Tiago, portanto, sua história, embora tenha grande importância na Salvação, não consta da Bíblia Sagrada. Assim, houve um interesse maior para saber da grande mulher, que teria sido aquela que enfrentou tantas dificuldades, tantos preconceitos por ser estéril. As pessoas estéreis em Jerusalém e no Oriente eram discriminadas e muitas vezes humilhadas.
Para nós, que crescemos desde muito criança frequentando a Igreja, nas missas infantis e catecismos, Sant’Ana preenchia o nosso conceito de protetora, preenchia a vida religiosa de Vargem Grande do Sul como Padroeira. Eu havia perdido minha avó muito cedo, mas sempre tinha esse conceito “que delícia ter avó” e no caso ter a avó de Jesus padroeira da cidade era uma grande honra.
Como muitas outras meninas do meu tempo, que faziam parte das Meninas da Cruzada, estávamos sempre na organização em frente à Matriz, das tradicionais procissões tão ricamente montadas pelo monsenhor Celestino Garcia, que como bom espanhol, tinha uma afeição enorme por elas como bem acontece na Espanha até hoje. A Semana Santa é um dos principais momentos da vida do espanhol e as procissões são, realmente, um dos maiores eventos religiosos católicos naquele país.
No Chá Cultural que fizemos em 1982 em homenagem ao monsenhor Celestino, que fizera na ocasião 50 anos de sacerdócio em Vargem, me lembro muito bem que, em seguida, fomos chamadas para apresentar a dança da Espanha aos pés do altar de Sant’Ana, no aniversário de sua ordenação. Foi um momento inexplicável de orgulho e satisfação de fazer algo antes nunca visto, dançar o flamenco aos pés da padroeira Sant’Ana naquela missa lotada de pessoas. Ainda hoje encontro meninas que participaram daquela dança e revivo aquele grande momento. O repicar do sapateado do flamenco no mármore aos pés do altar, ficou para sempre como uma coisa inédita nosso currículo daquelas meninas do Chá Cultural do Fleming.

Monsenhor Celestino Cabrera Garcia, que ficou à frente da paróquia de Sant’Ana de 1946 a 1984. As procissões que organizava em celebração à Padroeira ficaram marcadas na memória da população vagengrandense. Foto: Arquivo Gazeta

A procissões
Voltando à organização das procissões, a gente ficava quietinha, esperando ele dizer quem vinha primeiro, se era o Apostolado da Oração, se eram as Meninas da Cruzada, se eram os Congregados Marianos, as Filhas de Maria, ou se eram os homens da Liga Católica de Vargem Grande do Sul. Ele fazia isso com muito esmero, mas sempre dando o lugar de cada um em função da nossa Sant’Ana. A Padroeira sempre era a figura principal daquele rico momento tão memorável, onde apesar dele estar sempre gritando “Não pisem na grama, crianças”, “Olhem aí, cuidado com as filas’, frases que no seu sotaque arrastado ficaram por toda vida na nossa memória. Era sempre esperado o momento em que ele dizia: “Que venha agora o estandarte da Nossa Senhora a Padroeira Sant’Ana”, e então o andor muito lindo passava todo enfeitado para tomar o seu lugar. Ela era a dona de tudo.
Por tudo isso, porque, perguntava eu, ao procurar as medalhinhas, não havia tantas de Sant’Ana? Quem era ela antes de Maria?

Ana antes de Maria
Ana era filha de Natã, um sacerdote. Tinha duas irmãs mais velhas: Cleófas, que era mãe de Salomé e Sabé, mãe da prima Santa Isabel, que geraria mais tarde São João Batista, de tão linda história.
Ana então casou-se com Joaquim, que era um personagem da alta sociedade da época, muito bem situado e formavam um casal querido por todos e participavam das principais festas que aconteciam em Jerusalém. Porém, aos poucos foi-se evidenciando a esterilidade de Sant’Ana, quando tudo mudou e os preconceitos e discriminações por não terem filhos começaram a ser frequentes. Não suportando mais a situação junto à sociedade naquela época, Joaquim, homem de fé, se exilou no deserto, para fazer suas penitências, sempre acreditando em Deus, sempre acreditando no Pai, assim como Sant’Ana também sempre foi uma pessoa de muita fé. Até que um dia apareceu para ele um anjo que disse: “Joaquim, homem de fé. Suas preces foram ouvidas. Ana dará à luz e você sai ser pai da mãe do Salvador do mundo”.
Era a fé de Joaquim, a fé de Ana que possibilitou essa grande consideração, em compensação ao tanto que sofreram sem nunca se queixar e abalar a crença em Deus. Seriam os pais de Maria, e por sua vez, mãe de Jesus o Salvador e então, assim, a história dessa família se revela na história da Salvação.
Ana já estava com idade avançada, Joaquim também. Mas ainda mantinham sobretudo a esperança. E Nossa Senhora, nasceu então em 8 de setembro do ano 20 Antes de Cristo, quando então recebeu o nome de Míriam, Maria em hebraico, a futura mãe de Jesus. Todo aquele sofrimento vivido ficou para trás. Maria era a esperança e Sant’Ana se dedicou profundamente a ela como mestra, como mãe, daquela que veio a ser a mãe de Jesus Cristo, cuja história todos nós sabemos, de amor, penitência e salvação. Continua na próxima página.

Sant’Ana: Uma Santa do Oriente

Em Auray, na França, foi registrada sua única aparição, onde foi construída a catedral de Sainte-Anne-d’Auray. Foto: Divulgação

E foi por conta da história de Sant’Ana ter se desenvolvido no oriente, que toda sua saga e toda sua vitória marcou profundamente Jerusalém e toda região. Daí porque o culto de Sant’Ana rapidamente foi se espalhando rapidamente naquela região.
Sant’Ana, morreu aos 90 anos e suas relíquias ficaram no oriente. Até que em 710, em uma das invasões, Santa Maria Madalena e mais dois corajosos seguidores de Sant’Ana, com medo de que suas relíquias fossem profanadas, em uma fuga de barco carregaram as relíquias da Terra Santa para Constantinopla, onde foram guardadas na Igreja de Santa Sofia, catedral construída a mando do imperador Justiniano.
Parte dessas relíquias de lá foram espalhadas para alguns países ocidente, quando então a veneração e o culto a Sant’Ana foi se desenvolvendo. Cada parte do seu corpo foi doada para uma determinada catedral de importância da Europa, a maior delas, parte de seu braço, está na igreja de Sant’Ana, em Düren, Alemanha. Essa distribuição das relíquias de Sant’Ana entre as catedrais acabou dando um grande significado à sua história e fez fortalecer a fé em Sant’Ana, a partir daí e cada uma dessas catedrais beneficiadas pelo Papa passaram a multiplicar aos milhares seus peregrinos. Essas relíquias foram todas tradicionalmente veneradas nas muitas catedrais e mosteiros dedicados a seu nome na Áustria, Alemanha, Itália, Grécia. Düren foi o lugar mais importante de peregrinação desde o ano de 1506.
Na idade média, Sant’Ana foi também bastante cultuada. Em 1584, o Papa Gregório XIII, colocou como data maior da festa de Sant’Ana, o dia 26 de julho e o Papa Leão XIII estendeu a celebração para toda a igreja, em 1789.
Uma das maiores demonstrações da fé de Joaquim e Ana em Deus ocorreu quando apresentaram Maria aos sacerdotes no templo, num profundo gesto de admiração. E depois saíram de Nazaré, retornando a Jerusalém, seguindo com sua vida de dedicação e oração.
Ana sempre visitava Maria para juntas lerem as escrituras daí, Sant’Ana Mestra, além de Sant’Ana Guia, que deu a Maria uma educação muito esmerada para aquela que seria Mãe do Salvador. Hoje são muitas igrejas consagradas a Ana no mundo inteiro.

Peregrinação é intensa em Auray. Foto: Arquivo Pessoal

Aparição
Depois do Nascimento de Maria e de Jesus, uma das histórias mais importantes envolvendo Sant’Ana foi o milagre acontecido em Auray, na França, onde ela apareceu pela primeira vez, em um único lugar do mundo. Sant’Ana surge pedindo para que seus restos mortais fossem desenterrados, que estavam perdidos sob os escombros de uma antiga igreja.
Um dos maiores momentos da história de Sant’Ana, o episódio de Carlos Magno que reinaugurava uma igreja que durante muitos anos permaneceu soterrada e naquele dia, uma criança cega apontou o lugar onde as relíquias de Sant’Ana estavam enterradas há muitos séculos e ali naquele momento, as relíquias foram recuperadas e recolocadas onde Sant’Ana pediu. Ela queria fica ali, que a maior parte de suas relíquias ficassem ali, na França. Outras tantas partes de suas relíquias estão em várias catedrais da Europa. Mas há muito ainda o que saber sobre a linda história de Sant’Ana antes e depois de sua morte que ocorreu com mais de 90 anos. Tudo o que já dissemos mostra o que foi Ana, o que foi Ana e Joaquim, os avós, e os grandes frutos desse casal, Maria, a Mãe, e depois, Jesus.

Santa Sofia, catedral construída em Constantinopla, atual Istambul, abrigou as relíquias de Sant’Ana. Foto: Arquivo Pessoal

Atribuições
Sant’Ana é uma santa polivalente, como diríamos, de muitas proteções. Protetora dos mineiros, das famílias, das parturientes, das avós e algumas outras atribuições. Acho que é a santa com maior número de proteções já atribuídas pelos seus fiéis no mundo.

Sant’Ana Padroeira de Vargem Grande

Sant’Ana de Brincos, imagem que foi doada por D. Maria Cândida à Paróquia, no início do povoado vargengrandense. Foto: Arquivo Gazeta

Queremos lembrar aqui, que a primeira grande festa da nossa pequena vila, foi a festa da inauguração da primeira igrejinha matriz, comandada pelo grande empreendedor Cel. Mariano parreira. Exatamente ali no alto da colina onde se encontra a atual igreja matriz de Sant’Ana. Naquele dia, a nossa pracinha cheia de flores, estava em festa, com muitos visitantes de São João da Boa Vista, famílias engalanadas para essa grande ocasião, em que a banda criada especialmente para esse momento pelo Major Antônio de Oliveira Fontão fez a alegria daquela praça inteira. E foi neste momento, que Dona Maria Cândida ofereceu a pequena Sant’Ana de Brincos, que ainda hoje passeia pelas nossas novenas de julho e que ainda hoje se mantém perfeita, mostrando-se ali, como a grande marca daquele momento em que a pequena vila despontava e já podíamos comemorar o grande acontecimento.

Foto de Virgílio Forlin, mostra a Praça da Matriz de Sant’Ana, antes da atual construção. Foto: Arquivo Gazeta

Emancipação
E neste no de 2021, quando comemoramos em dezembro o centenário de nossa emancipação de São João da Boa Vista, vamos novamente saudar a Sant’Aninha de Brincos, nossa referência de devoção à Grande Mestra, Nossa Senhora Sant’Ana.

Oração
Nesta segunda-feira, dia 26, vamos pensar muito e orar muito para Sant’Ana, tende em vista o triste momento da pandemia, quando não poderemos fazer os nossos muitos festejos. Mas não nos esqueçamos nunca, que ela estará sempre ali, no alto da colina, olhando pelo povo de nossa terra.
Também roguemos à Sant’Ana Mestra, neste ano de 2021, que com sua sabedoria venha impingir em cada um daqueles que ainda se afastam das regras, da responsabilidade, de que esta é uma doença coletiva e que com esforço e o empenho, em nome de Sant’Ana, deveremos tudo fazer para que a nossa parte seja cumprida nessa batalha contra este mal que paira sobre o mundo.
Viva, Sant’Ana

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