Reinaldo Ricchi Jr – professor formado em Química pela Unicamp onde também desenvolveu os projetos de mestrado e doutorado
A Covid-19 acelerou a automação de muitas tarefas que antes eram realizadas exclusivamente por seres humanos. Esse fenômeno despertou o medo da conexão entre a inteligência artificial (IA) e o aumento do desemprego. No entanto, o Fórum Econômico Mundial estima que, até 2025, a IA de fato será responsável pelo desaparecimento de 85 milhões de empregos, mas também criará 97 milhões de novos empregos, que exigirão dos seres humanos habilidades cada vez mais ágeis e cognitivas [1].
A IA permitirá que os trabalhadores se concentrem em tarefas de maior valor agregado, com foco nas relações interpessoais. Para isso, habilidades como criatividade, pensamento estratégico e empreendedorismo serão cada vez mais necessárias. Essas habilidades só serão alcançadas com rigorosos programas de qualificação profissional, desenvolvidos através de parcerias entre o poder público e o capital privado. A qualidade dessas parcerias exercerá impacto diretamente no desenvolvimento econômico dos países. O Fórum Econômico Mundial prevê que nos próximos cinco anos, quase 2 bilhões de trabalhadores precisarão de alguma qualificação para se adaptar aos impactos da IA no futuro do trabalho. Essa qualificação deve ser considerada como um investimento estratégico capaz de aumentar a competitividade das empresas e dos governos [1].
O historiador israelense Yuval Harari é considerado um dos maiores pensadores da atualidade. Para analisar o futuro do trabalho, ele propôs um termo que provocou muita polêmica no mundo inteiro, ao dizer que a IA criará uma nova classe de seres humanos: a classe dos “inúteis”. O que ele quer dizer, exatamente, com esse termo? Essencialmente, ele entende que o impacto da IA na vida humana será tão profundo que muitos seres humanos não conseguirão ter influência econômica e política na sociedade, e, por isso, serão considerados “inúteis”. Essa é uma das ameaças mais terríveis do Século 21 [2].
No entanto, Yuval Harari concorda que, do ponto de vista moral, a aparente “inutilidade” de muitos profissionais não é real, pois a dignidade do ser humano ultrapassa sua importância econômica e política. Ele também acredita que essa dolorosa e desafiadora realidade pode ser controlada se os governantes acompanharem as grandes inovações, pois os cientistas e engenheiros possuem muito conhecimento técnico, mas é o poder dos líderes políticos que decide o futuro da humanidade [2].
Esse é um debate delicado, profundo e de máxima importância. A utilidade profissional estará cada vez mais relacionada à capacidade de se qualificar e se reinventar com agilidade e eficiência. Os líderes políticos, empresariais e científicos do mundo inteiro precisam trabalhar para construir consensos e visões unificadas. Líderes regionais também precisam customizar (ou seja: adaptar, ajustar) esse riquíssimo debate para suas realidades locais. Dessa maneira, as soluções inovadoras poderão ser aplicadas para que todos se sintam úteis e saudáveis diante dos vários desafios do nosso tempo, tanto nas esferas municipal, estadual e federal, como também na esfera global.
Referências
[1] www.weforum.org/agenda/2020/10/dont-fear-ai-it-will-lead-to-long-term-job-growth/
[2] amp.theguardian.com/technology/2016/may/20/silicon-assassins-condemn-humans-life-useless-artificial-intelligence