O rompimento da barragem de rejeitos da mineradora Vale, localizada em Brumadinho (MG), no último dia 25 de janeiro, provocou uma das maiores tragédias do país. Mais de 110 pessoas morreram e outras duas centenas continuavam desaparecidas, com chances remotas de serem encontradas com vida. O mar de lama varreu áreas da empresa e casas na área rural da cidade, no Córrego do Feijão.
Órgãos de imprensa de todo país e do exterior se deslocaram ao local para fazer a cobertura jornalística do caso. A documentarista vargengrandense Fernanda Ligabue participou desta cobertura pelo Greenpeace Brasil.
Em entrevista à Gazeta de Vargem Grande, Fernanda falou sobre como estava o local atingido. “Chegamos no sábado, mas as estradas que levavam até o Córrego do Feijão estavam destruídas ou interditadas pela polícia. Eu e a equipe do Greenpeace conseguimos acesso ao local através de uma carona com um morador que está com um irmão desaparecido e estava buscando por ajuda no momento. Chegando em Córrego conseguimos fotografar com drone algumas áreas atingidas pelo rejeito tóxico. A situação estava bem caótica, familiares desesperados e com eminência de rompimento de uma outra barragem. Ficamos em campo por uma semana e fomos registrando ao longo dos dias as consequências devastadoras nas vidas das pessoas atingidas, seus familiares e no meio ambiente”, disse.
De acordo com a documentarista, o trabalho foi bastante intenso. “Ficávamos em campo filmando o dia todo, colhendo relatos de testemunhas e familiares e à noite, quando voltávamos para a base do Greenpeace, ainda ficávamos a madrugada toda editando materiais de foto e vídeo para serem divulgados no dia seguinte”, comentou. “A urgência do acontecimento exigia turnos dobrados de trabalho, mas valeu a pena porque conseguimos divulgar as consequências do crime rapidamente nas redes sociais através de vídeos, entrevistas e reportagens que foram compartilhadas mundialmente, gerando pressão no governo brasileiro e principalmente na Vale”, observou.
Segundo Fernanda, a população local esta em choque. “Não existe uma pessoa de Brumadinho que não tem algum familiar ou amigo que não foi impactado pela tragédia. Muita tristeza e desespero por falta de respostas mais assertivas quanto à situação dos desaparecidos e pelo total despreparo da empresa para lidar com uma situação emergencial já prevista caso acontecesse o desastre. Não foi a primeira vez. A Vale é reincidente nesse crime, ela sabia das condições precárias da barragem. O que está acontecendo com a população de Brumadinho é cruel e criminoso. A Vale precisa ser fortemente punida e todas suas operações precisam ser imediatamente interrompidas até que haja uma nova reavaliação das condições de segurança e de impacto ambiental de suas barragens”, avaliou.
Repercussão
Uma das fotos feitas pela documentarista foi postada pelo Greenpeace Internacional e repostadas por muitas pessoas, inclusive o ator Leonardo DiCaprio, que tem forte atuação ambientalista. “A foto que fiz de drone dos escombros de um carro que foi arrastado pela onda de rejeitos da Barragem de Brumadinho até o rio Paraopeba, que agora está totalmente contaminado e tomado pela lama tóxica, está sendo divulgada amplamente por sites e redes sociais. Em alguns perfis de Instagram como do Greenpeace Internacional e do Leonardo DiCaprio, que repostou a foto em seu perfil oficial, já tem mais de 1 milhão de curtidas. Apesar da tristeza do desastre que transparece na imagem, eu fico feliz pela importância que representa a foto ser repercutida internacionalmente”, comentou.
“O crime da Vale no rio Doce em Mariana há três anos até agora não teve ninguém que foi responsabilizado e a Vale seguiu com seus trabalhos extraindo minérios e colocando vidas em risco impunemente. Isso não pode mais acontecer. Precisamos gerar uma grande pressão para que as leis de licenciamento ambiental para implantação dessas barragens não sejam flexibilizadas como já havia anunciado o novo governo. Precisamos que todos os cidadãos se conscientizem da tragédia gerada por esse crime da Vale com a população e com o meio ambiente. Muitas pessoas morreram, muitas ainda estão desaparecidas e todo um ecossistema foi brutalmente atingido. Um importante rio que abastece toda a região foi contaminado. A bacia hidrográfica do rio São Francisco, contaminada. A fauna da região brutalmente atingida. Esses impactos são irreversíveis e a Vale precisa ser fortemente punida por isso. Não que vá trazer algum alívio para os familiares e moradores da região. Isso não vai ser possível. Mas pelo menos vai pressionar para que empresas mineradoras como ela não cometam novamente esse mesmo crime”, disse.

Família de Rio Pardo morreu no desastre
Uma família de São José do Rio Pardo estava hospedada em uma pousada que foi atingida pela lama. Segundo o informado pelo Jornal Agora Rio Pardo, Adriano Ribeiro da Silva foi a passeio conhecer o Instituto Inhotim, considerado o maior museu a céu aberto do mundo, junto com os dois filhos, Camila Taliberti da Silva e Luiz Taliberti Ribeiro da Silva, com a esposa Maria de Lurdes Bueno e com a nora Fernanda Damian de Almeida, grávida de cinco meses.
Luiz, de 31 anos, que era arquiteto e morava na Austrália junto com a namorada, foi o primeiro a ser localizado. Ele foi encontrado na madrugada de quarta-feira, dia 30, e foi cremado na manhã de quinta-feira, dia 31, em Contagem (MG).
Na tarde de quinta-feira, foram identificados os corpos do empresário Adriano, de 61 anos, e da filha Camila, de 33 anos.
Segundo o padrasto da vítima, Vagner Diniz, os familiares só sairão de Brumadinho quando todos os desaparecidos da família forem encontrados. Até o fechamento dessa edição, Maria de Lurdes, de 59 anos e Fernanda, de 30 anos, ainda não haviam sido localizadas.