Dependência do celular pode levar a comportamento agressivo

Reinaldo foi entrevistado. Foto: Arquivo Gazeta

Os recentes acontecimentos envolvendo violência e ameaças nas escolas em várias cidades do Brasil e também em Vargem Grande do Sul, com a participação de jovens e estudantes, tem levado muitos estudiosos a relacionar o aumento da violência com o uso das redes sociais, através dos celulares. A reportagem da Gazeta de Vargem Grande entrevistou algumas pessoas sobre o assunto, inclusive o professor Reinaldo Ricchi Jr, que tem escrito sobre vários assuntos, inclusive abordando o uso das redes sociais pelos jovens. Ele é formado em Química pela Unicamp, onde também desenvolveu os projetos de mestrado e doutorado.

Gazeta: Como vê a dependência dos celulares e suas implicações na formação psicológica dos jovens?
Reinaldo: Pesquisas científicas mostram que é na educação fundamental que a questão da dependência de celulares precisa ser trabalhada. As consequências dessa dependência podem ser reduzidas se os pais assumirem uma relação mais consciente e disciplinada com os seus próprios celulares, pois esse comportamento influenciaria de maneira positiva os seus filhos. A dependência de celulares pode causar graves consequências, como isolamento voluntário, distorção da personalidade e comportamento agressivo [1]. O isolamento voluntário, por exemplo, estimula o consumo excessivo de conteúdos nocivos nas redes sociais, e é exatamente neste ponto que os trabalhos de expansão da consciência, através da oferta de conteúdos inovadores e qualificados, precisam ser aplicados, antes que o estado psicológico dessas crianças alcance um patamar praticamente irreversível.

Gazeta: Qual a relação entre redes sociais e cultura de violência?
Reinaldo: As tecnologias das redes sociais estão muito associadas à inteligência artificial. Os cientistas estão dizendo que as redes sociais conquistaram o coração e o cérebro da humanidade, e a humanidade perdeu. E por que perdeu? Perdeu principalmente porque a cultura de violência, divulgada livremente pelas redes sociais, já está impressa no inconsciente de bilhões de pessoas no mundo inteiro [2]. É preciso que um trabalho sério, contínuo e multidisciplinar seja realizado para tentar reverter essa situação, antes que seja tarde demais. Precisamos de agilidade, diálogo e clareza, pois a interação entre a inteligência natural (humana) e a inteligência artificial (computacional) definirá o futuro da humanidade.

Gazeta: Quais os caminhos para ajudar na solução desse problema?
Reinaldo: O desenvolvimento de um projeto robusto de conscientização coletiva é o primeiro caminho que deve ser percorrido para vencer as futuras batalhas com a inteligência artificial. É preciso ter uma consciência expandida e uma visão ampla sobre a gravidade do momento que estamos vivendo. Outro caminho necessário é o investimento sério em formação de capital humano altamente qualificado, para que todos nós possamos ter mais discernimento na utilização da Internet: talvez discernimento seja a palavra mais importante do nosso tempo. O terceiro caminho é a formulação de políticas públicas rigorosas, e isso já está acontecendo no Brasil e em vários outros países.

Gazeta: Quais as medidas que estão sendo tomadas para ajudar na solução desse problema?
Reinaldo: Na Câmara Federal, foi aprovado o projeto que cria a Política Nacional de Atenção Psicossocial nas Comunidades Escolares (PL 3383/21). Outro projeto, que já foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça e está pronto para ir a Plenário é o PL 563/20, que cria o Programa Nacional de Prevenção do Sofrimento Psíquico no Âmbito Escolar [3]. O Ministério da Justiça pediu nesta semana a remoção de pelo menos 511 contas que tenham conteúdo nocivo, e já preparou uma nova regulamentação para que esses conteúdos sejam retirados mais rapidamente da Internet [4]. Existe também a Operação Escola Segura, coordenada pelo Ministério da Justiça, por meio da Diretoria de Operações Integradas e de Inteligência, que já realizou diversas ações de enfrentamento a atos de atentado à vida e relacionados a discursos de violência. Entre as medidas, estão o monitoramento de publicações na Internet que estimulem massacres em escolas e pedidos de remoção desses conteúdos às plataformas de redes sociais [5].

Gazeta: O que seria mais eficaz para melhorar essa situação?
Reinaldo: No curto prazo, é preciso que o governo federal e os governos estaduais se mobilizem para aumentar a vigilância policial. A ideia de instalar detectores de metal em todas as escolas brasileiras talvez seja de difícil viabilidade econômica, mas é uma solução que pode ser amplamente debatida e adaptada às realidades locais. Além disso, a conscientização das crianças e adolescentes, envolvendo as dimensões profissional, social e psicológica, é um trabalho que deve ser realizado de maneira permanente, para que possíveis desvios de comportamento possam ser identificados o quanto antes. Esse trabalho de conscientização também precisa ser aplicado nos pais dessas crianças e adolescentes.

Gazeta: Como substituir os conteúdos de violência por conteúdos construtivos?
Reinaldo: Já existem algumas iniciativas importantes para tentar evitar a proliferação de conteúdos nocivos nas redes sociais. Uma delas é o SaferNet, uma organização sem fins lucrativos que monitora e combate discursos de ódio e ameaças na Internet desde 2005. A Alemanha implementou o Network Enforcement Act há cerca de cinco anos. Essa lei determina que as empresas têm 24 horas para retirar conteúdos que sejam considerados ilegais. Existe a expectativa de que essa legislação da Alemanha seja ajustada pelo DSA (Digital Services Act), que começou a ser implementado em países da União Europeia no ano passado [4].

REFERÊNCIAS
[1] www.gazetavg.com.br/2023/04/03/a-aprendizagem-continua-e-o-futuro-do-trabalho/
[2] www.jornalopcao.com.br/colunas-e-blogs/imprensa/yuval-harari-a-inteligencia-artificial-que-ate-leva-ao-suicidio-precisa-de-controle-da-sociedade-479050/
[3] www.camara.leg.br/noticias/949787-projetos-aprovados-pela-camara-preveem-apoio-a-saude-mental-nas-escolas/
[4] www.portaldacapital.com/2023/04/12/publicacoes-sobre-ataques-em-escolas-expoem-descontrole-do-brasil-em-falas-de-odio-nas-redes/
[5] www.gov.br/mj/pt-br/assuntos/noticias/operacao-escola-segura-intensifica-acoes-para-identificar-perfis-e-conteudos-de-ameaca-a-escolas

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