Editorial: A importância de discutir o novo decreto da Educação Especial Inclusiva

Estão corretos os dirigentes das Associações de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae) em lutar para que a sociedade, o Congresso e o Governo Federal discutam com profundidade o Decreto nº 12.686, de 20 de outubro de 2025, que institui a Política Nacional de Educação Especial Inclusiva e cria a Rede Nacional de Educação Especial Inclusiva. O decreto, que visa redefinir as bases do ensino inclusivo no país, precisa ser amplamente debatido pela sociedade.
A educação inclusiva vem sendo discutida no mundo todo e é um dos pilares de uma nação verdadeiramente democrática. Garantir que crianças, jovens e adultos com deficiência, transtornos do espectro autista, altas habilidades ou superdotação tenham acesso a uma escola pública de qualidade, com os apoios necessários, é assegurar o direito básico à aprendizagem e à convivência social. Entretanto, o modo como essas políticas são estruturadas — suas diretrizes, recursos, responsabilidades e impactos na rotina das escolas — precisa ser analisado com cuidado e transparência, diante da realidade do ensino brasileiro.
O novo decreto propõe a articulação entre União, Estados e municípios para fortalecer o atendimento educacional especializado e a formação continuada de professores. É um avanço importante, pois reconhece que a inclusão não é apenas tarefa do professor da sala de aula, mas de todo o sistema educacional. Contudo, para que essa política se traduza em resultados concretos, é preciso garantir investimento real, condições de trabalho adequadas e infraestrutura acessível nas escolas, o que hoje, infelizmente está longe de ser uma realidade.
Entre as discussões que o decreto desperta, uma das mais relevantes vem das Apaes e demais instituições especializadas. Elas expressam preocupação com o possível esvaziamento de alunos que hoje frequentam suas unidades, caso o processo de inclusão nas escolas regulares não seja acompanhado de políticas claras de transição e suporte. É preciso reconhecer que muitas dessas instituições desenvolvem um trabalho pedagógico e terapêutico de excelência, sendo espaços fundamentais de socialização e desenvolvimento, como é o caso da Apae de Vargem Grande do Sul, que faz um trabalho histórico, desde seu início ainda como o antigo Cepdex.
Além disso, as Apaes têm uma importância fundamental no atendimento de alunos com transtornos graves e múltiplas deficiências, que muitas vezes não conseguem se adaptar às redes regulares de ensino, mesmo com apoio especializado. Para esses estudantes, as Apaes oferecem não apenas educação, mas também acolhimento, tratamento individualizado e acompanhamento multidisciplinar — aspectos que dificilmente podem ser reproduzidos integralmente na estrutura de uma escola comum. Portanto, é essencial que qualquer política pública de inclusão respeite e preserve esse papel insubstituível.
Diante desse cenário, é de extrema importância que as Apaes e demais entidades de educação especial se organizem e promovam audiências públicas, convidando a sociedade, o poder público e as famílias para discutirem o conteúdo do Decreto nº 12.686 e suas implicações, como bem o fizeram esta semana a Apae de Vargem juntamente com a Câmara Municipal.
A população precisa tomar conhecimento de como essa nova política pode afetar o futuro das instituições e dos alunos que elas acolhem. A transparência e o debate público são instrumentos essenciais para que nenhuma decisão seja tomada sem o devido diálogo e sem considerar as realidades locais.
A implementação da Rede Nacional de Educação Especial Inclusiva pode representar uma ferramenta de integração e compartilhamento de práticas bem-sucedidas, mas só terá eficácia se houver participação efetiva das redes municipais e estaduais, bem como o envolvimento de pais, professores, entidades representativas das pessoas com deficiência e as próprias Apaes. Sem diálogo e sem ouvir quem vive a realidade da sala de aula e do atendimento especializado, qualquer política corre o risco de se tornar apenas um documento bem-intencionado no papel.
Por isso, é essencial que o Decreto nº 12.686 seja amplamente discutido em audiências públicas, conselhos de educação e fóruns municipais. A inclusão não pode ser imposta de cima para baixo — deve ser construída coletivamente, com base na escuta e na experiência de todos os que fazem parte do processo educativo.
A educação inclusiva é, antes de tudo, um compromisso ético com a igualdade de oportunidades. Discutir o novo decreto é garantir que esse compromisso se transforme em ação concreta — e que o direito à educação de qualidade seja realmente para todos, sem deixar de valorizar o papel histórico, humano e essencial das Apaes e instituições especializadas, que há décadas dedicam-se à formação, ao cuidado e à dignidade das pessoas com deficiência.

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